sexta-feira, 4 de setembro de 2009

O Defunto que Devia


Em Bom Despacho tinha um moço que devia tanto e a tanta gente que sua vida virou um inferno. O tempo todo batiam na porta dele para cobrar. Até que uma noite ele não agüentou mais e decidiu se fingir de morto.

Na manhã seguinte, quando os cobradores chegaram, encontraram o moço de olhos fechados, todo vestido de preto, quietinho, deitado em cima da mesa.

- Coitado, perdeu mais do que qualquer um de nós – eles disseram, e foram embora.

Mas um sapateiro muito sovina, a quem o moço devia um real, não quis saber de perdoar a divida. Ficou na casa, à espera dos parentes, para cobrar de quem pudesse.

O moço lá, se fingindo de morto, e nada de parente nenhum chega. Mesmo porque morto pobre não tem parente. Acontece que o sapateiro, além de pão-duro, era cabeça-dura, e não arredou o pé. Queria seu real.

Escureceu, uns ladrões passaram por perto, viram a porta aberta, a casa em silêncio, e decidiram entrar. O sapateiro só teve tempo de enfiar debaixo da mesa.

- Eta defunto desgraçado, não tem uma alma velando por ele! Por ele! – comentaram os ladrões.

E aproveitaram para dividir umas moedas que tinham roubado. Sobrou uma , e um ladrão propôs:

- A moeda é do primeiro que enfiar uma faca no peito do morto!

O defunto reviveu na hora e desandou a gritar:

- UI ui ui!

- Ei ei ei! – o sapateiro escutou o morto gritando e, lá debaixo da mesa, também desandou a berrar.

Quando os ladrões viram o morto gritar e escutaram aquela voz responder, saíram em correria, deixando o dinheiro para trás.

Já iam longe quando o mais valente deles, pensando e repensando nas lindas moedas, tratou de convencer os amigos a voltar:

- São duas almas penada, mas nós somos três dependas.

Voltaram. A essa altura o ex-morto já estaca dividindo a fortuna com o sapateiro. Quando os ladrões chegaram perto da casa, escutaram o tinlintar das moedas sendo repartidas e...

- E o meu real? E o meu real?

- Ai ai ai! São muitas almas! – gritaram os ladrões. O dinheiro nem está dando! E desapareceram de vez, estrada afora.

Angela Lago

Nenhum comentário:

Postar um comentário