Acredita-se
que, para viver outras vidas, é necessário morrer primeiro e, depois de algum
tempo, voltar. Eu já vivi muitas vidas, e nada disso foi preciso. Morei em
outros países, em épocas diferentes e até em séculos passados. Tudo em uma
única vida, a minha.
Beber
"Cherry Brand" nos bares de Paris era uma das coisas que eu adorava fazer,
mas um dia, algo terrível aconteceu e acabou com minha
alegria. Me transformei em barata. Todos se afastaram de mim, tinham medo e
nojo. Até que conheci uma velha, acho que era vidente, que me falou sobre meu
amor, tão perto de mim e eu o desconhecia. Foi na Ilha de Paquetá e eu
realmente encontrei o amor. Estava naquele garoto que eu conhecia desde
criança.
Casei-me
com um homem incorrigível, que amava e odiava ao mesmo tempo. Ele morreu, mas
não me deixou e passei pela deliciosa experiência de ter dois maridos. Vivi uma
paixão impossível e valsei sem melancolia, sem arrependimento.
Presenciei
a ditadura, no ano de 1968 e, apesar de algum tempo, parece que ainda não
acabou. Construí o império dos Diários e Emissoras Associadas e muito contribuí
para a comunicação. Passava os dias na Praça da Alfândega, convivendo com os
mais variados tipos, na época de seus Anos Dourados.
Conheci
muitos lugares. Viajei de barco durante cem dias e fiquei maravilhado com a
natureza, com o litoral brasileiro e até com a África que nunca chamou minha
atenção. Ainda sinto o cheiro do mar. Outra viagem interessante que fiz me
revelou fatos que não conhecia sobre o descobrimento do Brasil.
Integrei
o Clube do Picadinho, que diminuía a cada encontro. Sabíamos de quem era a vez,
mas nunca desistimos. A emoção e o perigo faziam com que essas fossem as
melhores refeições.
Esses são
apenas alguns relatos de minha vida. Poderia ficar por horas contando minhas
aventuras, descrevendo todas as pessoas que conheci e relembrando os infinitos
amores que tive. Talvez em outro encontro. Mas antes de me despedir, quero
contar como foi o meu primeiro contato com esse mundo maravilhoso.
Aconteceu
quando eu ainda era criança e minha mãe me apresentou à Turma da Mônica e
depois ao palhacinho Alegria. Eles se tornaram meus companheiros e, à medida
que fui crescendo, ganhei novos amigos.
Tenho um
poder espantoso. Através dele, conheci novos sentimentos, senti o gosto de
novas comidas e bebidas, sem nem mesmo ter experimentado, vesti-me como as
"sinhazinhas" do século passado, senti fome como Fabiano. Essa
capacidade mágica que tenho não é exclusividade minha, ela está adequada a
minha personalidade, mas todos podem ter, é só querer.
Além de
adquirir cultura e informação, desenvolvi minha criatividade, tive uma visão
mais ampla de certos assuntos. Dou asa a minha imaginação, e permito-me
conhecer novos costumes, lugares, vidas, mundos, sentimentos.
Vanessa
Mello
Fonte: http://www.pucrs.br/gpt/intertextualidade.php.
Acesso em 19 de maio de 2012.